Escrever sobre a saudade é como me submeter a uma cirurgia cardíaca. É evasivo. O meu coração está dentro de um globo de neve, na estante mais alta do meu quarto. Habitualmente, o sol ilumina esta esfera de vidro, mas nos dias em que a abano a neve cai e…
– Vão chamá-la Carolina. Abracei aquela barriga desde que soube que lá moravas. Não me convocaram para escolher o teu nome, mas se tivessem tinha sugerido Mulan, Ariel ou outro nome de princesa da Disney. Tinha apenas sete anos. Quando nasceste, peguei-te a medo, nunca havia segurado nada tão precioso…
– Oh meninas! Venham pôr-a-mesa! Gritavam os meus avós e pais, em passados mais distantes que outros. Éramos seis, na hora de pôr-a-mesa. Depois sete. Novamente seis. E depois cinco, porque eu parti. Lembro-me de revirar os olhos quando me chamavam, interrompiam sempre algo extremamente inútil, mas vital naquela idade.…
O dia foi feliz, pensava eu. Ela estava estranha. Estranha, como quando num grupo alegre, todos se divertem menos a tua amiga. E tu ficas sem jeito. Ela foi essa amiga, o dia todo. Pensando bem, o dia não foi feliz para ela. Fechou a porta de casa lentamente, com…
Mudei de casa e o espírito da criatividade desceu sobre mim. Finalmente ia viver sozinha, com toda a liberdade para decorar, cozinhar, deambular nua e apanhar coisas do chão com os dedos dos pés. Sem que ninguém me olhe de lado ou chame nomes. Inspirei-me em dezenas de imagens e…
Construí uma casa para ti, para mim, para nós. Sem paredes, um grande cubo envidraçado, não era palpável nem visível mas existia. Eu sei que existia. Estava repleta de gargalhadas contagiantes, silêncios contempláveis, carícias sentidas e olhares profundos. Cheirava a ti, a mim e a mar. E o que lá…
Quando viajo de autocarro tento ficar à janela. Sento-me, aconchego-me e quando o motor arranca, a minha mente dispara. No caminho, as diferentes paisagens surgem velozmente e o meu pensamento perde-se nas diferentes cores, texturas e sons. Fico ali, a olhar, a divagar e a transportar-me. Imagino-me a correr pela…
Na incerteza perco-me em pensamentos de perda e desapego. Ter de admitir que me morreste. Fugazes foram os momentos de companheirismo leal, verdade no olhar e alegria genuína que, por mim, expressaste. Mesmo assim, mudei para sempre. Pela dor obrigaste-me a crescer e nunca te vou agradecer por isso. Destruíste…
Incontáveis vezes vi a Alice. Vi-a em Amesterdão numa pequena doçaria sentada junto à vitrina, a beber um café, a trincar um queque de mirtilos e a escrever. Admirei a Alice não só aí mas todas as outras vezes que a vi, no mesmo cenário só mudando o que comia…
Hoje sem esforço ou nada que fizesse prever voltei a recordar-te. Sem saudade ou culpa, porque reviver não é pecado ou escolha. Lembrei de quando encaixavas a cabeça no meu peito, como as crianças que procuram conforto e abrigo. Sempre que o fazias os meus braços recebiam-te de imediato. Uma…